Alex Bastos
Para Fabiano Rezende
“Porque aquilo que temia me sobreveio; e o que receava me aconteceu.
Nunca estive tranquilo, nem sosseguei, nem repousei, mas veio sobre mim a perturbação.”
Livro de Jó 3:25-26
Minha vida pode ser resumida em poucas palavras – ou em muitas, se o leitor gostar de monotonia. Meu nome é Samuel Benedetti e meu atual estado mental se deve aos fatos que ocorreram durante o tempo em que trabalhei com um misterioso advogado.
Aos dezoito anos, eu era um perdedor e tinha consciência disso. Sabia que os demais me achavam estranho, mas não os culpo; minha permanente apatia pelo mundo real incomodava todos os que ansiavam por desfrutar as aventuras inexistentes da Terra.
Nunca me achei bonito, inteligente ou engraçado. Mesmo assim, consegui uma namorada que transbordava beleza. Ela era a única coisa que atraía todo o meu interesse; chama-se Amanda, dona de cabelos que parecem cascatas de ouro e olhos profundos e azuis.
Fui pressionado por meus pais a entrar na faculdade, e cedi. Estava na segunda fase do curso de Direito quando decide correr atrás de meus planos; acreditava ter maturidade suficiente para torná-los reais. Assim que terminou o ano – já estando apto à terceira fase –, comecei a procura.
Por fim, antes mesmo de poder perder muito tempo com esse assunto, um dos meus professores disse que conhecia alguém que, além de precisar de um estudante como eu, poderia me levar ao caminho de sucesso dentro do disputado mundo dos advogados – dos bons, pelo menos.
Recebi um cartão simplório; trazia o nome, o telefone e o endereço. Por dois dias seguidos fiquei repetindo o estranho nome: Johan Bouvier.
Na primeira vez em que fui conhecer o Sr. Johan, deparei-me com portas fechadas.
Na segunda, ele próprio atendeu a porta. Alto, magro, poucos fios de cabelo, pálido, olhos fundos e com olheiras.
Passamos pela bela sala de espera e fomos para seu escritório. As paredes eram todas recobertas de prateleiras de madeira antiga; nelas vislumbrei tomos dos mais variados títulos, pequenas obras de arte e algumas poucas fotos em preto e branco. A luz solar era filtrada por cortinas amareladas.
Passamos algumas horas falando sobre interesses mútuos, sobre deveres e obrigações de ambas as partes. Ele trabalhava na defesa de assassinos, era experiente nessa área e reconhecido por isso.
Fui embora com a promessa de retornar na semana seguinte. Trabalharia à princípio como um secretário; ele disse que tinha muitos documentos para organizar e o mesmo tanto para passar para dentro do computador, algo que ele não tinha a mínima ideia de como fazer. Soou estranho para mim.
Cada gênio com sua mania, pensei na época.
Comecei com o pé direito. Johan não tinha economizado quando decidiu organizar um espaço para mim. No fim da grande sala de espera estava montado um computador de última geração sobre um balcão de madeira, igual ao do escritório dele.
Senti-me um pouco estranho no início. Johan passava horas e horas fechado em silêncio, ou o mesmo período conversando com assassinos.
O trabalho aumentava cada dia mais. Johan trazia caixas e mais caixas de documentos impressos, digitados, notas sobre processos, fotos, assinaturas, provas, pastas e vídeos. Alguns, creio, eram de quando ele tinha começado na profissão.
Muitas vezes senti dúvidas quanto a como arquivar ou que programa usar, mas o acesso ilimitado a internet foi a melhor coisa que ele poderia ter feito para facilitar o serviço e afastar minhas dúvidas.
O telefone não tocava com a frequência que à princípio eu imaginara, mas o carteiro parecia complementar esse trabalho. Não havia um dia sequer sem que o Sr. Johan recebesse correspondência, ou as enviasse.
Fui encarregado de trabalho de banco e pelas idas aos correios.
Essa correspondência acordou em mim algo que eu não deveria ter usado naquele momento. A curiosidade.
Com o passar dos dias, notei que a maioria das cartas – recebidas e enviadas para diferentes estados e outros países – tinham uma coisa em comum. Os remetentes eram sempre Sociedade R’lyeh.
Eu organizava as encomendas por tamanho antes de bater na porta do chefe e entregá-las sorrindo.
“O que é a Sociedade R’lyeh?”
Johan pensou por um momento sem alterar as feições faciais.
“É um grupo de amigos advogados.”
“Entendo.”
E ele puxou com força as cartas de minha mão. Pela primeira vez.
Na semana seguinte as cartas chegaram normalmente, mas nenhuma era da Sociedade R’lyeh. Ele também havia parado de enviá-las.
“Você está se dando bem com seu chefe?”
Eu estava com a cabeça sobre o colo de Amanda. Quando podia, passava na casa dela depois do trabalho – tinha que aproveitar as férias.
“Sim, mas aconteceu algo diferente. Ele recebia e enviava várias cartas, e todas tinham o mesmo remetente. Sociedade R’lyeh.”
“Conheço esse nome de algum lugar.”, afirmou enquanto coçava minha cabeça. Amanda sabia muita coisa, gastava todo o tempo livre lendo. Lia como se dependesse daquilo para viver. De certa forma, eu admirava seu gosto.
“Ele disse que é um grupo de amigos advogados. Mas o estranho é que depois que eu perguntei o que era essa sociedade elas pararam de chegar e ele parou de enviá-las”
“Talvez ele seja excêntrico, mas antes de ir embora escreve o nome em um papel que depois eu vejo.”
“Ok.”
Eu já estava a ponto de esquecer completamente o caso de R’lyeh quando Amanda ligou-me durante uma tarde chuvosa. Não havia ninguém na sala de espera, então atendi ao telefone com tranquilidade.
“Achei informações sobre R’lyeh. Passa aqui em casa que eu te mostro.”
Naquela noite Amanda apresentou-me as obras do escritor Howard Philips Lovecraft, famoso por seu trabalho com o terror e suspense e por ter uma mitologia própria. Ela tinha dois livros dele.
R’lyeh não passava de uma cidade gigantesca, onde morava um “deus extraterrestre” conhecido como Cthulhu.
Havia muitas outras coisas estranhas como os “Antigos”, Shoggoths e o Necronomicon.
“Ele realmente tinha uma mente perturbada.”, comentou ela antes de me beijar.
Chegamos à conclusão que Johan fazia parte de um clube de leitores de H.P. Lovecraft, e havia ficado envergonhado com isto. Não vi motivos para tal.
As coisas correram bem no mês seguinte; cada vez mais notei que ganhava a confiança de Johan, apesar de termos desenvolvido apenas uma amizade superficial. Não me importava.
Um dia, ele me pediu para fechar o contrato de aluguel de um barracão, que eu conseguisse pessoas para limpá-lo e cento e vinte cadeiras.
Saí com meu carro para conversar com o dono das cadeiras e o resto foi mais fácil. Fiz tudo com rapidez, como dizem: ‘a dinheiro exibido, tudo é permitido’.
Mas a curiosidade voltou.
Curiosidade.
Maldita.
Quando voltei para o trabalho, Johan não estava mais e tinha esquecido a porta do escritório aberta.
Na mesa dele havia uma escultura. Horrível, nunca havia visto antes.
Era, na verdade, um Cthulhu em miniatura. Um ser esverdeado dotado de asas com serrilhamento nas bordas, mãos fortes e cinco tentáculos que lhe saiam da cabeça cefalópode. Ele sentava-se sobre um trono com ar de rei e olhar de demônio.
Os pelos do meu pescoço ficaram eriçados.
Fechei a porta do escritório e encontrei na minha mesa um bilhete de Johan, queria que eu passasse na casa dele para entregar a chave do barracão alugado.
O locador enviou-a por um motoboy. Ele não esperava sair antes que a chave fosse entregue, mas foi necessário.
Não demorou muito e ouvi a moto parando do lado de fora do prédio.
Quando ele atravessou a porta eu já estava postado ao lado do alarme, preparado para ligá-lo, passar a chave na porta e partir.
“Olha o que encontrei caído ali na porta.”
Ele estendeu uma carta, reconhecia-a imediatamente. Amassada e suja, mas reconhecível.
Coloquei-a dentro do meu bolso.
Eu pressentia que algo estava errado durante todo o caminho. Minha avó geralmente tinha sonhos proféticos, nada que interferisse em nosso dia-a-dia.
Dirigi até a mansão de Johan. Estacionei na frente dos portões de entrada.
Peguei a chave no banco do passageiro.
Aconteceu.
Os meus olhos não viam mais os portões, mas sim uma cidade ciclópica. Gigante em todos os aspectos, com formatos inimagináveis, símbolos nunca vistos e grandes espaços preenchidos por água.
O cheiro salgado e inigualável de mar era forte; o vento percorria as tenebrosas fundações de R’lyeh murmurando.
Tive certeza que era a cidade de Cthulhu. Senti sua presença adormecida em algum lugar, mas existente e pulsante.
Ouvi vozes humanas, todos falando em inglês. Tranquilamente compreensíveis para mim.
Meu corpo não estava lá, apenas minha consciência. Flutuei pela cidade, seguindo as vozes. Encontrei os donos das vozes, um grupo de homens carregando equipamentos. Johan estava lá.
Era o chefe da missão.
Os outros eram membros da Sociedade R’lyeh.
A cidade transformou-se em meu carro, os portões e a mansão. A chave continuava em minha mão.
Não desconfie em momento nenhum que a experiência tinha sido verdadeira. Havia visto desenhos de R’lyeh, baseados nos contos de H. P. Lovecraft, mas nada tão profundo quanto a realidade aterrorizante que tomou o controle de minha mente.
Antes que alguém me visse ali voltei para o centro da cidade o mais rápido possível. Tirei uma segunda cópia da chave.
Abri a carta, e li.
Caro Mestre,
A tradução do Necronomicon está sendo finalizada pelo escolhido. A cópia falsa do livro trocada pelo curador do Bibliotheque Nationale ainda não foi e nem será descoberta.
O livro será dividido entre os participantes da Sociedade. Sabemos do poder do livro e não queremos pisar no solo da loucura. Ao final das leituras individuais, cada
um deverá resumir com suas próprias palavras a parte lida e enviar para os demais membros.
Não está morto o que pode eternamente jazer e
com eras estranhas a morte há de morrer.
A carta datava de dois meses. Fora enviada do estado de Santa Catarina.
O que quer que tivesse sido traduzido, já fora feito.
Fui até a casa de Johan. Com o empregado dele deixei apenas a chave verdadeira do barracão. Pisei no acelerador e rumei para a casa de Amanda. Ela estava sozinha.
Primeiro fizemos amor, uma forma inútil de tentar esquecer a visão, a carta e meus temores. Depois de aproveitar as belas curvas do corpo de Amanda, conversei com ela francamente, ocultando a parte da visão.
Mostrei a carta; ela não achou correto eu ter lido, mas também não me repreendeu.
“A história de Cthulhu e do Necronomicon são totalmente literárias. Não existem de maneira alguma. H. P. Lovecraft misturou alguns livros reais e alguns imaginários para tornar mais verdadeiro seus contos.”
“E de certa forma isso contribuiu para que as histórias dele ficassem conhecidas.”, finalizei.
“Isso mesmo.”
“Além do mais, se o Necronomicon existisse e alguém o traduzisse sozinho, provavelmente enlouqueceria.”
Mudei de assunto. Não adiantaria.
Johan parecia muito feliz no dia seguinte, e quando entrei no seu escritório não havia vestígios da feia estátua.
“Amanhã eu não trabalharei; você está dispensado, também.”
“Sem problemas.”
Voltei a fazer meu serviço, mas a chave em meu bolso parecia arder.
Eu tinha que fazer alguma coisa. A palavra Apocalipse parecia ser murmurada em meus ouvidos o tempo todo.
Mas não tinha ideia do que fazer.
Antes de sair, fiz uma pesquisa em um site de busca. Usei duas palavras: Tradutor louco.
A maioria dos tópicos era de quinze dias atrás.
Tradutor Kevin Carareto suicidou-se hoje pela manhã.
Um dos mais famosos especialistas em tradução, Kevin Carareto, conhecido por sua fluência e estudo nas mais variadas línguas antigas suicidou-se hoje por volta das sete horas da manhã.
“Ele estava trabalhando em um projeto o qual não quis divulgar; não sabemos se chegou a terminar. O fato é que ele surtou e infelizmente cometeu suicídio.”, informou um colega da Universidade de Miskatonic.
Lamentamos esse acontecido e desejamos os pêsames à família.
Você pode conferir a lista de livros escritos e traduzidos por Kevin Carareto clicando aqui.
Antes de dormir li o conto “O Chamado de Cthulhu”, não restavam dúvidas. De certa forma, eu sabia que H. P. Lovecraft não criara aquilo, ele apenas repassou informações verdadeiras, de uma maneira menos idiota.
Minha noite foi tragada por um pesadelo. As pessoas tinham tornado-se cefalópodes-humanóides. Emitiam sons afogados e consumiam os dias em adorações, cânticos e meditações para Cthulhu.
Era um pesadelo profético, e eu o profeta perturbado.
Às sete da manhã, estava estacionado, com o carro de um amigo, próximo à mansão dele. Por volta das oito ele saiu sozinho dentro do Camaro negro. Segui-o de longe, e sabia que ele estava indo para o barracão.
Cortei caminho para chegar antes e me esconder lá. O prédio tinha uma iluminação decadente; as cadeiras estavam lá, assim como a estátua do Deus-extraterrestre sobre um altar improvisado.
Escondi-me no segundo andar não acabado atrás de sacos de cimento vencido. Coloquei toda a minha esperança em que não me encontrassem.
Johan entrou no prédio carregando um notebook Apple, um retroprojetor e algumas extensões. A farsa havia terminado, pelo menos para mim.
Ele ligou o notebook com as extensões e passou a testar o retroprojetor na imensa parede pintada com cal branca. Tudo ali cheirava a mofo.
Aos poucos os membros da Sociedade R’lyeh chegavam. Adoradores de Cthulhu e servos de Johan Bouvier. Nenhum trazia traços de pobreza, simplicidade ou tristeza.
Todos sorriam e cumprimentavam-se como no fim da missa de Natal. Exceto, é claro, as várias línguas pronunciadas que se misturavam no ar.
Johan iniciou o encontro mostrando um vídeo através do retroprojetor. O vídeo da expedição à R’lyeh, a visão que eu tivera. Eles invadiram gravando o espaço onde Cthulhu repousava, mostraram todo o seu corpo gosmento de aspecto milenar enquanto retiraram amostras superficiais de pele, gosma e garras.
Ele falou muito mais depois do vídeo e outros intercalaram a palestra.
“Reajustamos com nossos colegas de laboratório as células de nosso Deus.”, disse um dos cientistas.
“E finalmente nos tornaremos a imagem e semelhança dele.”, falou Johan.
Duas pessoas atravessaram o corredor entre as cadeiras, todas lotadas agora, empurrando um carrinho cheio de instrumentos que não consegui ver bem. Em pouco tempo, o próprio Johan tirou a roupa, trocando-a por um pijama simples – aparentemente não ficando nem um pouco envergonhado.
Primeiro ele engoliu um comprimido, e os outros dois homens que tinham empurrado o carrinho injetaram em seu braço uma ampola de um líquido amarelado.
Não aconteceu nada.
Até que ele caiu, subitamente.
Os médicos presentes quase levaram as cadeiras junto em prol de ajudar o Mestre.
Mas antes que pudessem erguê-lo ele tinha se posto de pé. Os olhos eram dois pontos completamente amarelos e leitosos.
Houve sussurros, até que ele começou a transformar-se. Primeiro a camiseta rasgou-se e ele se virou para mostrar no novo par de asas adquirido, a pele rasgada sangrava manchando o chão.
Esperei que o corpo ficasse esverdeado, mas não aconteceu.
O pomo de adão pareceu derreter dentro do pescoço,
O crânio sofreu alterações enquanto ele gritava em plenos pulmões. Os convidados da festa agora começaram a demonstrar preocupação. O cabelo caiu completamente enquanto os poros produziam o líquido viscoso que molhava as calças e pingava entre os dedos que estavam mais pontudos que antes.
Os tentáculos brotaram, onde antes havia existido uma barba rala.
Cinco tentáculos formados de pele flexível.
Uma mulher gritou de emoção e bateu palmas de felicidade.
“A vacina poderá ser feita em cada pessoa que conhecemos.”, concluiu um outro.
“Na verdade será mais simples se colocarmos na água, demora um pouco mais, porém tem o mesmo efeito final.”, informou o cientista que havia aplicado a injeção.
Eu tinha perdido a parte onde ser humano era doença.
Não esperei muito, antes de pegar o celular e mandar uma mensagem pedindo para Amanda vir o mais rápido possível meu ajudar. Eu havia deixado o meu carro na casa dela, que ficava mais próxima. Sabia que iria precisar.
Mas ela não veio.
Enquanto isso, mais um dos presentes transformava-se em imitações de Cthulhu, para grande exultação dos demais.
Esperei um pouco.
Amanda não chegou.
Liguei para o celular, a mensagem dizia que número não existia.
Decidi sair por mim mesmo dali; a porta estava fechada, mas não trancada.
Desci as escadas e fui para a porta. Porém, cometi o mesmo erro da mulher de Ló: olhei para trás.
Não entendi o significado dos grunhidos que o novo Johan dera, mas a tradução foi simultânea. PEGUEM-NO.
Corri e me escondi. Eles me encontraram.
Sedaram-me e quando acordei estava deitado sobre o catre de uma prisão abandonada.
Com um pedaço do espelho quebrado que encontrei sobre a pia consegui visualizar parte do corredor e de um corpo, meio humano, meio Cthulhu apodrecendo. O espelho caiu.
O fedor chegou ao meu nariz.
Voltei a deitar, com fraqueza e dor.
O celular continuava dentro do bolso da minha calça. Pela data fazia três dias que eu estava sendo sedado.
Liguei para todos os celulares que tinham em minha agenda, os poucos que atendiam limitavam-se em emitir os sons precários da linguagem que eu ouvira Johan falar depois da transformação.
A foto de proteção de tela mostrava uma árvore, onde antes existia Amanda em frente à árvore.
Procurei as fotos que tinha dela. Onde era para Amanda aparecer não havia ninguém. Eu estava sozinho nas imagens, beijando o vento e abraçando o invisível.
Gritei, desejando que minhas cordas vocais se partissem.
Joguei o aparelho na parede, vendo as partes caírem.
Uma das mulheres que estava no barracão veio ao meu encontro. Abriu a cela e sentou-se aos meus pés, trouxe água e comida.
Conversamos, ela tinha um revólver.
Contou-me que todos os demais humanos estavam aos poucos transmutando-se através da água com a solução especial. Quem não aceitava era caçado e morto; aparentemente a carne de humanos puros havia tornado-se um ótimo aperitivo.
Deu-me uma página do Necronomicon traduzida. Eu li e chorei.
A alma de Cthulhu estava dentro do corpo adormecido, que tinha limitações, mas poderia habitar outra casca enquanto o corpo descansava.
A casca era eu.
Johan tinha me dado este privilégio, entre todos os demais.
Foi como ser o primeiro judeu que Hitler odiou.
Apenas chorei.
Agora termino meu breve relato. Posso ouvir nitidamente o som dos aviões criados para transportar o corpo de Cthulhu; vão guardá-lo em algum lugar próximo. Não tenho dúvidas de que vou ser possuído por sua alma podre e não acredito que voltarei a viver depois dessa experiência.
Em até certo ponto desejei ter sido um humano-cefalópodo, mas quem sentiria a transformação seria o próprio Chutlhu.
Penso se Amanda realmente existiu ou foi obra de minha imaginação, agora mais perturbada que antes...
Espero que este texto chegue nas mãos de pessoas que não tenham sucumbido ao poder dos Servos de Cthulhu e que consigam de alguma forma reverter este apocalipse alienígena nunca imaginado por outros, apenas por mim.
Samuel Benedetti,
com fé.